Porque só Mateus escreve a cláusula sobre porneia?



Seria Cristo quem anunciou isso ou os copiadores do texto de Mateus é que acrescentaram? Mateus diz que, a não ser por causa de pecado sexual (Mt 5:32; 19:9). Porém, Marcos e Lucas não usam esse termo (Mc 10:11; Lc 16:18). Poderia eu usar isso como uma doutrina, já que só Mateus aborda isso e os demais escritores não mencionam?

RESPOSTA:

A cláusula de exceção por "porneia" (geralmente traduzida como "imoralidade sexual", "fornicação" ou "infidelidade conjugal") aparece apenas no Evangelho de Mateus (Mt 5:32 e 19:9), enquanto Marcos (Mc 10:11-12) e Lucas (Lc 16:18) apresentam o ensino de Jesus sobre divórcio de forma absoluta, sem menção a qualquer exceção. Isso tem gerado debates entre estudiosos bíblicos, teólogos e historiadores sobre as razões para essa diferença e se o texto é original ou uma adição posterior. Vou explicar passo a passo com base em análises acadêmicas, incluindo perspectivas variadas para uma visão equilibrada.

1. Por que só Mateus inclui essa cláusula?

Contexto da audiência e tradição judaica: Mateus foi escrito principalmente para um público judeu-cristão, familiarizado com a Lei de Moisés e debates rabínicos sobre divórcio. No Antigo Testamento, Deuteronômio 24:1-4 permitia o divórcio por "indecência" (em hebraico, ervat davar), interpretado de forma ampla pela escola de Hillel (quase por qualquer motivo) e mais estrita pela de Shammai (apenas por imoralidade grave). 

Jesus, em Mateus, parece alinhar-se à visão mais rigorosa, usando "porneia" para especificar uma exceção que ecoa essa tradição judaica, possivelmente para esclarecer que o divórcio só seria válido em casos de violação grave do pacto matrimonial, como incesto, prostituição ou infidelidade durante o noivado (betrothal, um período legalmente vinculante na cultura judaica). Marcos e Lucas, dirigidos a audiências gentias (romanos e gregos), não precisavam dessa nuance cultural, focando no princípio geral de que o divórcio e recasamento equivalem a adultério.

Exemplo do noivado de José e Maria: Em Mateus 1:18-19, José considera "divorciar" Maria por suspeita de porneia (gravidez antes da consumação), mas não o faz.

Alguns estudiosos veem a cláusula como uma referência a situações como essa, comuns no judaísmo, explicando por que só Mateus a menciona – para conectar o ensino de Jesus à narrativa inicial do evangelho.

Diferenças nos evangelhos sinópticos: Os evangelhos não são relatos idênticos; eles complementam uns aos outros. Marcos (provavelmente a fonte mais antiga) e Lucas enfatizam a proibição absoluta para reforçar a novidade do ensino de Jesus contra práticas romanas liberais de divórcio. Mateus adiciona a exceção possivelmente para aplicar o ensino a questões práticas na comunidade, sem contradizer o cerne da mensagem. Paulo, em 1 Coríntios 7, também não menciona porneia, focando em separação sem recasamento, o que sugere que a exceção não era central para todos os contextos.

Perspectivas variadas:

Visão conservadora/evangélica: A cláusula reflete palavras autênticas de Jesus, adaptadas ao público de Mateus.

Visão crítica/acadêmica: Pode ser uma inserção editorial de Mateus (ou sua comunidade) para lidar com problemas reais, como casamentos mistos ou incesto, mas ainda original ao autor, não uma adição posterior.

Visão católica: "Porneia" não significa adultério (que seria moicheia), mas uniões inválidas ou ilícitas (ex.: incesto, cf. Levítico 18). Assim, não permite divórcio verdadeiro, mas anulação de casamentos não válidos desde o início.

2. Seria algo anunciado por Cristo ou adicionado por copiadores?

Originalidade do texto: Não há evidências textuais fortes de que a cláusula seja uma interpolação (adição por copistas posteriores). Ela aparece em todos os manuscritos antigos principais de Mateus, como o Codex Sinaiticus e Vaticanus (século IV). Debates sobre interpolação surgem mais de interpretações teológicas do que de variantes manuscritas – por exemplo, alguns argumentam que a ausência em Marcos e Lucas sugere que não era parte do ensino original de Jesus, mas sim uma adaptação de Mateus. No entanto, a maioria dos estudiosos (incluindo em fóruns acadêmicos como AcademicBiblical) considera-a autêntica ao evangelho de Mateus, possivelmente refletindo uma tradição oral específica ou ênfase do autor. Não é como casos claros de interpolação, como o final de Marcos 16:9-20 ou a coma joanina em 1 João 5:7-8.

Provavelmente anunciado por Cristo: Muitos teólogos defendem que Jesus disse algo similar, mas os evangelistas o registraram de formas adaptadas. A absoluta proibição em Marcos/Lucas pode ser o "núcleo duro", com Mateus adicionando contexto para evitar mal-entendidos em um ambiente judaico.

3. Poderia usar isso como doutrina, já que só Mateus aborda e os outros não mencionam?

Sim, você pode, dependendo da tradição cristã à qual se filia, pois a Bíblia é interpretada como um todo harmônico, e menções únicas não invalidam um ensino se não houver contradição explícita. Em muitas denominações protestantes e evangélicas, a cláusula é usada como base doutrinária para permitir divórcio e recasamento em casos de infidelidade sexual, vendo-a como uma exceção válida que complementa (não contradiz) Marcos e Lucas. Por exemplo, é comum em igrejas reformadas ou batistas.

No entanto, com cautela: Em tradições como a católica ou ortodoxa, não é vista como permissão para divórcio, mas para reconhecer uniões inválidas, mantendo a indissolubilidade do casamento válido.
Alguns grupos conservadores (ex.:某些 visões reformadas) argumentam que Marcos deve ter prioridade, vendo a exceção como limitada a contextos judaicos específicos, e defendem proibição total.

Para usar como doutrina, considere o contexto amplo: Jesus enfatiza a permanência do casamento (Mt 19:6; Mc 10:9), e Paulo reforça isso. Consulte comentários bíblicos ou pastores para alinhar com sua fé.

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